Entrevista Camila Caggiano do Sob as Estrelas
Sua Casa é o Mundo: Como é viver numa van?
Camila Caggiano: Muitas pessoas disseram para eu fazer alguma viagem de curta duração com minha pequena van, para sentir como seria, mas a van ficou pronta praticamente na véspera da minha partida, e fui descobrindo durante a viagem como é morar numa fiorino.
A primeira coisa que descobri é que é preciso ser metódica, coisa que nunca fui. Eu já tinha lido que essas fotos de van todas arrumadinhas, só existem pra foto. Isso é uma realidade. Manter a van arrumada mais do que dois dias é praticamente impossível, pois passo muito tempo dirigindo e quando paro quero escalar ou descansar. Depois de dois meses na estrada ainda estou descobrindo como isso vai funcionar.
Escolhi como “casa” uma Fiorino, pois era a maior da categoria, o tamanho da cama é quase de casal, então durmo muito confortável. E diferente de uma Sprinter, o carro enfrenta qualquer estrada de terra, importante para uma escaladora.
Fui de São Paulo até o Ushuaia dormindo sempre em postos de gasolina, pois tem banheiro, comida e internet. Agora estou viajando pela Patagônia e durmo sempre no meio da natureza, gosto mais disso.
SCM:Você que montou seu carro, certo? Como foi montar cada detalhe? Você já sabia como fazer ou aprendeu para montar o seu?
Camila: Eu construí praticamente sozinha o carro todo. A única parte que não fiz foi colocar a segunda bateria. Apesar de ter trabalhado 5 anos como eletricista em cinema, achei melhor contratar alguém que soubesse alterar o motor do carro.
Passei 4 meses cuidando do revestimento térmico, pois tinha medo de sofrer com as baixas temperaturas do Ushuaia e região. Nunca tinha feito nada semelhante, então eu pesquisei na internet como fazer. Quando faltava um mês para a partida iniciei a construção dos moveis. Quando conclui minha mãe disse que achava que não ia conseguir devido ao longo tempo que levei com o revestimento interno, mas para minha surpresa construir moveis foi muito fácil. Passei muitas horas deitada detro do carro olhando cada canto e criando, e tive alguns conselhos da minha prima Andrea Ornellas, que é arquiteta, e um pouco de ajuda da minha mãe na parte do acabamento, detalhes para deixar minha “casinha” bonita. Mas no geral construí praticamente tudo e fui descobrindo como fazer enquanto construía.
SCM: Como foi a decisão de mudar o estilo de vida? O que te motivou?
Camila: Um ano atrás estive na Patagônia com uma mochila de 80 litros nas costas com roupas e coisas de camping e uma de 45 litros na frente com equipamento de escalada. Descobri que da mochila de 80 litros utilizei praticamente um terço do que trouxe. Vim preparada para as condições duras do clima, mas me adaptei facilmente. A única coisa que senti é que quem estava de carro tinha muitas vantagens.
Então pensei, se eu tiver um carro que possa dormir dentro, compenso de alguma forma o custo da gasolina economizando com estadia e transporte aéreo.
Sempre sonhei conhecer o mundo tudo e passei toda a vida esperando juntar dinheiro para fazer de uma forma segura. Mas o que é seguro? Um hotel? Um avião? Nada é 100% seguro. Percebi que se continuasse procurando a forma “correta” de viajar pelo mundo, talvez nunca o fizesse.
SCM: Qual o maior desafio para você?
Camila: O maior desafio certamente é manter alguma organização dentro da van. Mas isso está me ensinando algumas coisas, como por exemplo, desacelerar a vida e tirar um dia só para organizar, outro para escalar, outro para fotografar. Aos poucos estou entendendo que não tenho que viver no ritmo das metrópoles, que cada coisa tem seu tempo.
SCM: Do que mais sente falta?
Camila: Banho quente!!! Tenho um tubo de água de 50 litros que esquenta com o sol, mas os ventos patagônicos, o frio, não ajudam. Sou uma pessoa muito comunicativa e conheço muitas pessoas por onde passo. Aprendi a nunca negar a oferta de um banho.
SCM: Como você faz pra se sustentar financeiramente nessa jornada?
Camila: Passei meses juntando dinheiro, mas como sou fotógrafa, tenho alguns projetos que espero que possam gerar nova renda.
SCM: Tem sido diferente do que você planejou?
Camila: Na verdade não planejei. Tentei não pensar em como seria para não criar expectativas. Mas as poucas coisas que imaginei estão indo muito bem. Sempre tenho parceria para escalar, recebo muitos “regalos”, as pessoas são muito solicitas e querem ajudar em tudo. A única coisa que está um pouco diferente é a questão do tempo, como disse, aprendendo a lidar com o fato de não dar pra fazer tudo num único dia.
SCM: Você viaja sozinha? Você tem medo? Como é como mulher viver numa van?
Camila: Viajo sozinha porque não quero ter planos, quero liberdade para mudar de rota quando quiser. Não tive medo em nenhum momento. Busco lugares seguros para passar minhas noites e sigo viagem durante o dia. Pra não mentir tive medo da tempestade de raios que passei em Buenos Aires, foi assustador! E também dos ventos do sul da Argentina, eles puxam o carro violentamente, passar de 80km em alguns lugares pode significar perder o controle do carro. Muitos tombam e tive que dirigir segurando o volante com força.
Algumas vezes não estive só porque dei carona para mochileiros que esticaram a mão. Mas enquanto estou só, o fato de ser mulher só tem me ajudado, até a policia argentina me parabeniza e sigo tranquila, não passei nenhuma situação de corrupção como me alertaram.
SCM: Se a galera quiser acompanhar sua aventura como faz?
Camila: Tenho um site que escrevo as coisas que vou aprendendo pelo caminho que é o www.sobasestrelas.com.br .
Uso muito o Instagram @sobasestrelas, principalmente os stories, onde posto vídeos do dia a dia numa van sempre que posso.
E o facebook Sob as Estrelas.
SCM: Camila, muito obrigada! Foi muito bom saber mais da sua experiência nessa aventura. Ficaremos ligados nas suas atualizações nas redes. O SCM deseja a você um excelente viagem e bons ventos!
